CIPA: a sua necessidade no teletrabalho CIPA: a sua necessidade no teletrabalho

CIPA: a sua necessidade no teletrabalho

A Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA) tem como objetivo a prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho

Por Otávio G. Almeida e Layon Lopes*

A legislação e a regulamentação sobre a CIPA não são claras sobre sua obrigatoriedade para as empresas que adotam o trabalho telepresencial, o que ocasiona uma grande situação de incerteza, pois a constituição de uma CIPA é algo que exige um grande preparo da empresa, visto que implica na adoção de atividades específicas e mudanças organizacionais, sendo um processo com muitos detalhes, prazos, processo eleitoral rígido, treinamento, etc.

O que é uma CIPA?

A Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (CIPA), regulamentada pelo artigo 163 e pela NR-5 (Norma Regulamentadora 5), tem como objetivo a prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho, de modo a tornar compatível permanentemente o trabalho com a preservação da vida e a promoção da saúde do trabalhador. As CIPA’s desempenham um papel de intermediação entre poder público, empregador e empregado para a conformidade do ambiente de trabalho e são essenciais para assegurar ambientes laborais produtivos e saudáveis, dirimindo ao máximo ocorrências de acidentes e doenças do trabalho. 

Embora o trabalho remoto (teletrabalho, ou mais carinhosamente: home office) não seja uma novidade tão grande, introduzida pela Reforma Trabalhista, o período de exceção e calamidade pública vivido no mundo e no Brasil impulsionou um grande êxodo, que para muitos é permanente, do trabalho presencial para o remoto.

Neste contexto, instalou-se uma situação de imprecisão jurídica sobre o instituto que é muito importante no contexto trabalhista. Diante disso, algumas perguntas são levantadas, como:

Afinal, as empresas devem ou não constituir uma CIPA, caso seus colaboradores trabalhem remotamente? Como se desenvolve o papel da CIPA num contexto laboral tão diferente do presencial? A CIPA é obrigatória? As empresas têm obrigação de fiscalizar o empregado, mesmo que ele trabalhe na sua própria casa? Como se fiscaliza o domicílio do empregado?”

A Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), após a Reforma Trabalhista operada pela Lei nº 13.467/2017, teve um novo capítulo introduzido, que dispõe do artigo 75-A ao 75-E quem é o teletrabalhador, e ponto que nos faz partir para a necessidade ou não das CIPA’s em regimes home office é o seguinte:

“Art. 75-E.  O empregador deverá instruir os empregados, de maneira expressa e ostensiva, quanto às precauções a tomar a fim de evitar doenças e acidentes de trabalho; Parágrafo único: O empregado deverá assinar termo de responsabilidade comprometendo-se a seguir as instruções fornecidas pelo empregador.” 

Constata-se que não há qualquer tipo de excepcionalidade expressa em relação ao cuidado do trabalhador remoto, pelo contrário, reafirma o dever de fiscalização por parte do empregador a fim de evitar acidentes de trabalho e doenças decorrentes da atividade laboral. O artigo acima estipula que deve ser redigido em termo e assinado pelo empregado, sua concordância de que siga as regras de segurança e saúde estabelecidas. 

Uma mera assinatura de termo é suficiente para que o dever do empregador de manutenção e fiscalização sanitária do ambiente laboral remoto?

Não. Veremos que a mera assinatura de Termo de Responsabilidade não afasta a necessidade da CIPA, pois os direitos dos trabalhadores de forma presencial e remota não são diversos entre si, assim como o dever de vigilância para regularidade sanitária que fica mantido independente da localidade de realização do trabalho, conforme os artigos 6º e 154 da CLT, no entanto existem algumas peculiaridades que merecem ser observadas, para que as empresas não ultrapassem seus limites de fiscalização.

Quando o domicílio do empregado é seu ambiente laboral:

Dever de Fiscalização: O chamado dever de fiscalização do empregador é voltado para observância e fornecimento de condições gerais básicas da atividade laboral: cumprimento do limite de jornada, fiscalização e fornecimento de materiais para desempenho das funções laborais de forma saudável e segura, usar seu poder diretivo para punir atos faltosos e proporcionar um ambiente laboral saudável e seguro.

Ambiente Laboral: O ambiente laboral é o local onde é desempenhado o trabalho. Podendo ser presencial ou remoto. Caracterizada uma relação de emprego, não há distinção entre o local de trabalho sendo realizado no estabelecimento do empregador, em home office ou a distância.

O Dever e os Limites de Fiscalização das Empresas no Home Office

O local da prestação do trabalho seja o domicílio do próprio empregado, seja na modalidade presencial conserva a responsabilidade de fiscalização do empregador. No entanto, no home office fica dificultada a fiscalização, no sentido de que embora seja o ambiente laboral, também é o domicílio do empregado. 

A “inviolabilidade do domicílio” é um direito fundamental que delimita que ninguém poderá adentrar no domicílio sem o consentimento do morador, salvo em casos de flagrante de delito, desastres, prestação de socorro ou por determinação judicial. 

Diante dessa restrição, em favor do direito à privacidade do trabalhador é que surge a dúvida acerca dos limites de fiscalização do trabalho remoto. 

O fato é que o home office não exime a responsabilidade de fiscalização, a fim de manter a regularidade sanitária do ambiente de trabalho, pois esta obrigação é inerente ao risco da atividade organizacional de tomada de serviço. 

O dever de fiscalizar o ambiente laboral, visando evitar riscos de acidentes ou desenvolvimento de doenças laborais, inclusive psicológicas, não prevalece absolutamente sobre a inviolabilidade do lar do trabalhador, este terá a faculdade de permitir ou não a verificação do ambiente, mesmo assim limitada ao espaço destinado ao trabalho.

O home office exige que o empregador, de maneira clara e reiterada, informe quais são as precauções que o empregado deve ter a fim de desenvolver doenças e acidentes de trabalho. É necessário que sempre haja um termo de responsabilidade assinado, em que se firme o comprometimento com as normas de prevenção fornecidas pelo empregador. Para além do termo de responsabilidade, é recomendável o desenvolvimento de uma política informativa de prevenção.

Não há o afastamento da necessidade de dimensionamento e instituição de CIPA quando atendidos os requisitos dispostos na NR-5, assim como a mera assinatura de Termo de Responsabilidade não indica a desnecessidade. 

Como as empresas devem se posicionar?

Atualmente, não havendo normativa a respeito, a resposta mais prudente acerca da fiscalização do domicílio do trabalhador é de que ao ser instituída a CIPA, seja adotado um procedimento de pedido de autorização documentada do empregado, para que o fiscal do trabalho adentre no seu domicílio e que seja inspecionado somente o ambiente em que o trabalho é desempenhado. 

Resta claro que o empregador pode requerer, isto é pedir autorização, para que seja inspecionado o domicílio do empregado. Não há qualquer vedação. 

Entretanto, os contratos de teletrabalho podem recair em uma prática de adoção de cláusulas compulsórias que estabeleçam a obrigatoriedade de fiscalização da casa do empregado, porque tal prática é facilmente caracterizável como abuso nas relações de trabalho, e consequentemente violações de direitos fundamentais. 

Cláusulas em Contrato de Trabalho que prevejam inspeções não são recomendáveis. Mesmo tornando efetivo o controle para a segurança do empregado, são abusivas. 

Em suma, o empregado não pode ser impelido a aceitar que, por exemplo, o empregador exija exercer uma fiscalização em todo domicílio. Portanto, limita-se ao local específico do trabalho.

Ademais, a CIPA também deverá se ater a questões como: “Etiqueta Digital”, Ergonomia, Saúde Mental, Jornada de Trabalho, a fim de assegurar o estabelecimento de uma política sanitária e digital para promoção de um ambiente laboral com menor incidência de intercorrências. 

Recentemente, o Ministério Público do Trabalho sinalizou que irá avançar com a fiscalização do trabalho telepresencial, inclusive publicou diretrizes e direcionamentos sobre o assunto. Ou seja, um sinal de luz alta foi dado, é preciso avaliar a adoção de medidas sanitárias, assim como normas de etiqueta digital.

Quais são os pontos que devem ser observados?

1) CIPA: Seja instituída a CIPA quando cumpridos os requisitos previstos na NR-5, mesmo que o trabalho seja desempenhado em home office. 

Fiscalizações: No âmbito da CIPA, as fiscalizações ficam limitadas pela anuência do empregado que não deve ser constrangido a aceitá-la ou surpreendido. A anuência deve ser documentada. A anuência não deverá estar contida em cláusula no contrato de trabalho ou aditivo, no sentido de evitar qualquer litígio. Deverá sempre ser acordada no âmbito da CIPA.

2) Ergonomia: Devem ser observados os parâmetros de ergonomia, principalmente da NR-17. Devendo ao empregador informar de forma clara e ostensiva ao empregado.

3) Termo de Responsabilidade: É imprescindível que haja anuência expressa sobre as normas de segurança, saúde e ergonomia informadas pelo empregador. Deve ser documentado e assinado termo.

4) Situação Contratual: Todos empregados que atuam na modalidade de trabalho remoto devem ter seus contratos, ou previsão em aditivo, que tratem de forma específica sobre a duração do contrato, a previsão de reembolso de despesas decorrentes da atividade laboral, a responsabilidade e cessão de materiais e infraestrutura para o desenvolvimento da atividade laboral.

5) Etiqueta Digital: A Etiqueta Digital é um termo amplo para designar condutas recomendadas de relacionamento no meio digital, ou melhor, são condutas que visam assegurar um bom ambiente digital, mas que possuem implicações legais quando não respeitadas, portanto, é recomendável a adoção de uma Política Informativa.

A Política Informativa contra práticas de intimidação sistêmica, assédio e bullying devem ser abordadas a fim de evitar maiores problemas no contexto laboral.

6) Direito à Desconexão: Deve ser orientado de forma clara e, preferencialmente, documentada sobre os horários de atendimento de demandas, assim assegurando o respeito ao limite da Jornada de Trabalho

7) Saúde Mental: Assim como as questões de ergonomia, entra no “guarda-chuva” de uma Política Informativa o desenvolvimento de recomendações claras para a manutenção da higiene e saúde mental, visto que as doenças psicossomáticas podem entrar no rol de doenças do trabalho, bem como é dever do empregador zelar pela saúde mental do empregado.

 

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*Layon Lopes é CEO do Silva | Lopes e Otávio Almeida é integrante do time do escritório.

 

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