Plano de Stock Options: natureza mercantil ou remuneratória?

Tema da natureza jurídica de Stock Options ainda é matéria controvertida do país

Plano de Stock Options: natureza mercantil ou remuneratória? Plano de Stock Options: natureza mercantil ou remuneratória?

Por Paola Martins, Gustavo Chaves Barcellos e Layon Lopes*

Toda a empresa é constituída de pessoas. O material humano e os talentos são o principal ativo por detrás de qualquer negócio, capaz de alavancar o negócio ou fadar o mesmo ao insucesso. Não por acaso, programas de retenção de talentos como o Stock Options vem ganhando espaço no mercado.

Em todos os segmentos de mercado, programas como Stock Option, Partnership, Phantom Stocks e RSUs vem sendo mais discutidos, estudados e aplicados. Ainda que cada um destes programas possua particularidades, características e aplicações próprias e distintas entre si, estes se aproximam em sua finalidade: proporcionar ao colaborador um atrativo para permanecer por longos períodos atuando junto à empresa ofertante.

Neste sentido, a oferta do plano de Stock Options, enquanto programa para atração e retenção de talentos em empresas, busca motivar equipes e melhorar resultados internos através de um estímulo econômico e patrimonial que proporciona ao colaborador sentir-se dono do negócio juntamente com os fundadores. 

A figura do Employee Stock Options é importada, oriunda da prática norte-americana, e pode ser traduzida ao português como Opção de Compra de Ações aos empregados. Esta modalidade de remuneração variável vem sendo cada vez mais utilizada no Brasil, principalmente no mercado de tecnologia e em empresas early stage.

Isto porque, nesta fase, startups acabam não dispondo de caixa suficiente para remunerar de forma atrativa os melhores profissionais do mercado. Assim, buscam alternativas para fazer com que a colaboração em sua empresa seja financeiramente atrativa aos seus prestadores de serviços.

Por esta razão, o plano de Stock Options, enquanto mecanismo de bonificação variável, torna-se interessante, tanto para a empresa ofertante quanto para o beneficiário contemplado, mediante a concessão, pela empresa ou seus sócios, do direito de o beneficiário comprar ou emitir quotas ou ações de emissão da sociedade. Em tal cenário, o colaborador beneficiário recebe, como bonificação variável, participação societária na empresa para a qual presta serviços.

Vale destacar aqui, que a anuência com um plano de Stock Options, pelo colaborador beneficiado, trata-se de mera possibilidade, alternativa que lhe é dada pela empresa e pelos sócios. Não há, portanto, obrigatoriedade em aceitar este benefício, que, via de regra, é estendido aos colaboradores chaves e pessoas estratégicas.

Outra importante característica do plano de Stock Option que merece ser objeto de apontamento, é o fato de que inexiste no Brasil regramento específico e minucioso sobre o tema.

A única previsão existente encontra-se dentro da Lei das Sociedades por Ações, que, em seu artigo 168, parágrafo terceiro, dispõe que “o estatuto pode prever que a companhia, dentro do limite de capital autorizado, e de acordo com plano aprovado pela assembléia-geral, outorgue opção de compra de ações a seus administradores ou empregados, ou a pessoas naturais que prestem serviços à companhia ou a sociedade sob seu controle.” Este dispositivo é o único que, em todo o ordenamento jurídico pátrio vigente, versa de forma direta sobre o tema de outorga de opção de compra de ações, ou seja, de Stock Options. 

Não há, portanto, maiores estruturas, características ou marcos a serem observados para a estruturação de um plano de Stock Options, para além dos seguintes, em matéria de sociedades por ações:

  1. Previsão em estatuto social;
  2. Existência de capital autorizado;
  3. Existência de Plano de Stock Options;
  4. Aprovação do Plano de Stock Options em Assembleia-geral;
  5. Beneficiário ser uma pessoa física;
  6. A companhia contar com Conselho de Administração, em razão do capital autorizado.
  7. Celebração de contrato de opção de compra de ações entre empresa e beneficiário.

Stock Options para sociedade limitadas

Já em âmbito de Stock Options para sociedade limitadas, as quais representam a maior monta de empresas constituídas e operantes no país, não há de se falar da obrigatoriedade de observância destes requisitos, bastando, para fins de formalização a celebração de contrato de opção de compra de quotas entre empresa e beneficiário.

Destaca-se, nesta sendo, que o plano de Stock Options tem natureza contratual, não estatutária, uma vez que será regulamentado entre as partes por um contrato de opção de compra de ações. É justamente em relação à natureza do plano de Stock Options, enquanto bonificação variável, que reside o maior ponto de controvérsia e insegurança jurídica em relação ao tema.

Isto porque muito se discute se a outorga de Stock Options aos colaboradores possui natureza mercantil, tratando-se de relação paritária, em igualdade de condições entre as partes (empresa e colaborador beneficiário), ou se, em verdade, possui natureza remuneratória.

Esta discussão impacta frontalmente na tributação das Stock Options

A Receita Federal já se manifestou pelo entendimento de que as Stock Options possuem natureza de verba remuneratória, considerando que:

  • A aquisição do direito à participação societária em geral é realizada pelo colaborador por preço abaixo do praticado em mercado (valuation da companhia), sendo, muitas vezes, utilizado o valor nominal das quotas, preços simbólicos, ou, ainda, em diversos casos, sem que ocorra nenhuma espécie de contrapartida financeira, pelo colaborar à empresa ou sócios, pela participação societária recebida;
  • A principal contraprestação ofertada pelo beneficiário colaborador, nestes casos, não é financeira, e sim consistente tão e somente em sua permanência como prestador de serviços da empresa emissora do benefício.

Assim, com base no artigo 43 do Código Tributário Nacional, considerando os conceitos de renda e provento, a Receita Federal entende pela natureza remuneratória, incidindo Imposto de Renda pessoa física, e tratamento como salário, sujeitando-se às contribuições previdenciárias e trabalhistas. 

A tributação das Stock Options é matéria controvertida, pois está diretamente relacionada com a classificação da natureza jurídica deste instituto, que, em razão da ausência de regulamentação no país, ainda oferece discussões.  O mercado, ao contrário do posicionamento exarado pela Receita Federal, tende a enxergar nas Stock Options uma natureza comercial, decorrente de vínculo contratual livremente estabelecido entre as partes.

Neste cenário, diante da alegada natureza mercantil, a tributação incidente seria apenas o Imposto de Renda da pessoa física colaborador beneficiário em caso de eventual ganho de capital apurado quando da venda da participação societária adquirida.

Apesar da Receita Federal já ter manifestado entendimento de que teria natureza remuneratória, com consequentes encargos trabalhistas, é consolidada a prática de mercado de outorga de Stock Options tendo por premissa sua natureza mercantil. 

Considerando os elementos apontados como principais fatores para o mecanismo de bonificação variável de Stock Options ser encarado, pela Receita Federal, como de natureza remuneratória, qual seja a ausência de onerosidade (não pagamento de preço razoável pela aquisição das ações) e contraprestação somente por prestação de serviço, nos parece que tais risco são mitigáveis diante de uma estruturação contratual adequada de tal programa. Desta forma, faz-se necessário que o empreendedor e a empresa adotem cuidados específicos para fins de mitigar o risco de que os Stock Options sejam tidos como de natureza remuneratória e não de natureza mercantil, ou seja, comercial.

Entre os principais cuidados a serem tomados, destacamos:

  • Efetivo desembolso por parte do colaborador: É essencial que, para a configuração de uma transação mercantil de participação societária, haja uma contraprestação financeira, pelo beneficiário colaborador. O valor estipulado para o efetivo exercício da aquisição da participação societária necessita ser adequado, e, principalmente, não basta que seja meramente fixado no papel, sendo imperioso que seja de fato desembolsado, ou seja, o preço seja realmente pago, ocorra o fluxo financeiro do bolso do beneficiário colaborador para a empresa ou sócios, caracterizando a natureza mercantil do ato; e
  • Clareza nos instrumentos: neste tipo de operação, a estruturação assertiva tanto no contrato de opção de compra de quotas/ações, quanto em eventual plano de Stock Options é essencial, inclusive para fins de melhor relacionamento da empresa para com seus colaboradores beneficiários. É necessário que estejam claras diversas situações atinentes à futura relação societária, como previsão de acordo de sócios, regras de sucessão, possibilidade de recompra, dentre outros fatores, e, no que tange especificamente à configuração da natureza remuneratória do programa, faz-se relevante que no contrato conste que a aquisição das participações se trata de um direito, e não uma obrigação, de subscrever participações societárias.

Assim, vê-se que o tema da natureza jurídica de Stock Options ainda é matéria controvertida do país, em principal em razão da ausência de normativa específica e suficiente que regulamente a matéria, além de entendimentos, interpretações e aplicações discrepantes, sendo de suma importância que haja a efetiva aquisição da participação societária por parte do colaborador, ainda que por um valor descontado, de modo a não submeter à sociedade a riscos trabalhistas e societários, uma vez que a legislação brasileira não permite a integralização de capital social por prestação de serviços e, também, para não caracterizar natureza remuneratória.

Dúvidas? A equipe do Silva Lopes Advogados pode te ajudar!

*Lopes é CEO do Silva Lopes Advogados, Chaves Barcellos é sócio e Martins é integrante do time do escritório.