Lei de Ambiente de Negócios: o que você precisa saber

Texto se propõe a desburocratizar os procedimentos e regramentos de abertura e funcionamento de empresas no Brasil

Lei de Ambiente de Negócios: o que você precisa saber Lei de Ambiente de Negócios: o que você precisa saber

Por Laura Mallet, Paola Martins e Layon Lopes*

A Lei nº 14.195/2021 (denominada de “Nova Lei de Ambiente de Negócios”), sancionada em 26 de agosto deste ano, visa desburocratizar os procedimentos e regramentos de abertura e funcionamento de empresas no Brasil. O objetivo é o avanço do país em 20 posições no ranking Doing Business do Banco Mundial, em que atualmente o Brasil ocupa o 124º lugar.

A lei já em vigor e produzindo efeitos, salvo pontuais exceções que passarão a produzir vigorar apenas futuramente, como a vedação de cumulação de cargos de presidente do conselho de administração e de diretor presidente de companhias abertas, que somente passará a vigorar em 360 dias a partir da publicação da legislação em comento. O texto trouxe alterações em diversas legislações, dentre elas normativas expressivas tais como a Lei de Sociedades por Ações (Lei nº 6.404/1976), no Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/15) e no Código Civil (Lei nº 10.406/02).

Para fins de favorecer o ambiente de negócios no Brasil, a nova normativa traz disposições com o intuito de facilitar a abertura de empresas, além de dispor sobre a proteção de acionistas minoritários, sobre a facilitação do comércio exterior, sobre o Sistema Integrado de Recuperação de Ativos (Sira), sobre as cobranças realizadas pelos conselhos profissionais, sobre a profissão de tradutor e intérprete público, sobre a obtenção de eletricidade, sobre a desburocratização societária e de atos processuais e a prescrição intercorrente.

O que mudou para abertura de empresas no país?

Como algumas das mudanças mais celebradas, uma vez que a burocracia para abertura de empresas no Brasil tem sido uma dor de empresários de todos os ramos de atuação, estão os novos procedimentos facilitados para abertura de empresas.

As novidades que destacamos são:

  • a facilitação do processo de abertura de empresas por meio da unificação de inscrições fiscais federal, estadual e municipal no CNPJ;
  • a emissão automática de alvarás de funcionamento para empresas que desenvolvam atividades que sejam consideradas de médio risco, sem análise humana; e,
  • a automatização da checagem de nome empresarial em segundos.

O que é voto plural?

Destaca-se a criação do voto plural, mecanismo através do qual é admitida a criação de uma ou mais classes de ações ordinárias com atribuição de voto plural, não superior a dez votos por ação ordinária, ou seja, tanto o acionista minoritário, com uma menor quantidade de ações, pode ter maior poder de voto nas deliberações da empresa, quanto os founders podem manter o controle de suas empresas mesmo sem deter a maioria do capital social o voto plural. Isto porque o voto plural permite que uma única ação tenha direito a múltiplos votos durante as assembleias.

Este voto plural terá vigência inicial de até sete anos, prorrogável, sendo possível estipular-se que o fim da vigência do voto plural fique condicionado a um evento ou a termo.

Como a nova lei facilitou as operações no comércio exterior?

A lei trouxe regramentos que visam alcançar a desburocratização, simplificando, portanto, os procedimentos de autorização e licença para importação e exportação, bem como busca promover a modernização do comércio exterior brasileiro.

A disposição que mais se destaca para o alcance desse objetivo é a automatização do sistema de comunicação direto entre os órgãos e os importadores e exportadores, através da criação de guichê único eletrônico, a ser gerido pelo Ministério da Economia.

Este sistema centralizará:

  • o envio de exigências administrativas, tais como documentos, dados e informações, para os órgãos da administração pública federal responsáveis por esse tipo de demanda;
  • o acesso, pelas instituições financeiras que operam no mercado de câmbio, aos dados de seus clientes que estejam ali dispostos, quando assim lhe for autorizado;
  • o recolhimento das taxas impostas pelos órgãos responsáveis através de transação financeira eletrônica, via Documento de Arrecadação de Receitas Federais (Darf), permitindo, preferencialmente, que o pagamento se dê de forma unificada.

Ressaltamos que o guichê eletrônico será o único meio de envio dos requisitos necessários para importação e exportação.

Ainda, a imposição de licenças ou autorizações para os processos de importação e exportação em razão de características das mercadorias, apenas serão necessárias quando a lei assim a exigir, tornando esses processos, em consequência, mais rápidos.

Por fim, para tornar os processos mais céleres e simplificados, a Lei de Ambiente de Negócios trouxe alterações nas regras de origem não preferenciais, utilizadas para definição do país de origem de um produto que poderá vir a ser tratado de forma diferenciada pelo país importador no que concerne questões regulatórias, comerciais e administrativas, quando o país exportador não faz parte de acordo preferencial de comércio do qual o país importador faz parte. As principais novidades se encontram em maior detalhamento de produtos que podem ser considerados originários, através da inclusão de novos produtos, no que se considera “mercadoria produzida” e da inclusão de novas hipóteses de transformação substancial de produto.

O que é o Sistema Integrado de Recuperação de Ativos (Sira)?

Este sistema, o qual consiste em um conjunto de instrumentos, mecanismos e iniciativas, visa facilitar a identificação e a localização de bens e de devedores, bem como a constrição e a alienação de ativos.

O principal mote da sua criação é, justamente, dar efetividade às decisões judiciais as quais, não raras vezes, resultam ineficazes, por ausência de ferramentas que possibilitem localizar bens e devedores, bem como viabilizar a constrição e alienação de ativos.

A ideia é que o SIRA centralize informações de banco de dados, para consulta, como o Sistema de Busca de Ativos do Poder Judiciário – Sisbajud (que interliga Justiça, Banco Central e bancos para pedir informações bancárias e promover a penhora online), o Renajud (usado para restrições sobre veículos), e o Infojud, (destinado a magistrados e servidores autorizados a obter dados da Receita Federal para localizar pessoas e bens das partes envolvidas em processos judiciais).

É o fim da EIRELI?

A empresa individual de responsabilidade limitada – EIRELI, tipo de pessoa jurídica introduzido no Código Civil brasileiro, na época, como alternativa para resguardar os empresários que quisessem exercer suas atividades de forma unipessoal, sem a presença de um ou mais sócio, chegou ao fim. Sua extinção já era discutida e até mesmo esperada no ambiente jurídico e empresarial, pois, em razão do elevado capital social mínimo que exigia (cem vezes o salário mínimo vigente) o mecanismo acabou sendo menos difundido do que se esperava.

A Lei de Ambiente de Negócios expressamente previu que as EIRELIS atualmente existentes serão transformadas em sociedades limitadas unipessoais, independentemente de qualquer alteração em seu ato constitutivo.

Quais foram as alterações no processo civil em favor de pessoas jurídicas?

A Lei de Ambiente de Negócios, ao tratar da racionalização processual, trouxe novidades em relação à forma e prazo de citação processual, a forma do pedido de exibição de coisa ou documento e nova hipótese de suspensão de execução. A inovação mais relevante e que trará mais impacto positivo ao processo judicial é a possibilidade de a citação se dar por meios eletrônicos, tal como o e-mail, preferencialmente aos demais meios já previstos.

Somado a isso, a Lei de Ambiente de Negócios definiu que a citação deverá ser realizada em até 45 dias da propositura da ação, e após a determinação da citação pelo juízo, este deverá realizá-la em até dois dias úteis. Este ponto de alteração do texto se deu em consonância à informatização do processo judicial, que ao longo dos anos vem sendo instituído, tanto com a criação de processos eletrônicos, quanto com a possibilidade de integração entre os sistemas do poder judiciário e da Redesim (Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios).

Outros pontos de relevância a serem observados é a estipulação de maior detalhamento do pedido de exibição de coisa e documento, bem como a possibilidade de suspensão de execução quando não encontrado o executado ou seus bens penhoráveis – anteriormente a isso, a suspensão apenas se dava quando confirmado que o executado não possuía bens penhoráveis.

As alterações acima mencionadas demonstram a tentativa da Lei de Ambiente de Negócios de alcançar maior celeridade aos processos judiciais, tanto através de estipulação de prazos que visam limitar o período gasto pelo judiciário para a realização de atos processuais, quanto a implementação de medidas que visam diminuir a discussão e esclarecimentos sobre pedidos realizados no processo.

A Nova Regulação do Commercial Paper: o que mudou?

Uma das grandes inovações trazidas pela Nova Lei é a instituição de regulação específica referente às notas comerciais, comumente conhecidas no mercado como Commercial Papers, que até então observavam as regras da ICVM nº 566.

Como destaques dessa regulação estão:

  • A obrigatoriedade de emissão das notas comerciais exclusivamente sob a forma escritural por meio de instituições autorizadas pela CVM a prestar o serviço de escrituração, ou seja,
  • A possibilidade deste título de crédito poder ser utilizado por sociedades anônimas, sociedades limitadas e sociedades cooperativas.

Essas alterações são importantes, visto que, em primeiro, não é mais necessária a emissão de cártula, e em segundo, torna-se um novo meio de capitalização para demais empresas, visto que as notas comerciais se limitavam apenas às sociedades cooperativas que atuavam na área do agronegócio.

No mais, a nota comercial passou a ser entendida como título executivo extrajudicial, podendo ser executada independentemente de protesto.

Também, está permitida a inserção de cláusula de conversibilidade dos valores do título de crédito em participação societária, permitindo demais formas de pagamento da nota comercial no mercado empresarial.

Além desses pontos, a regulação determinou que a CVM pode estabelecer requisitos específicos para a emissão de notas comerciais, e determinar a contratação de agente fiduciário para notas comerciais ofertadas publicamente ou admitidas à negociação em mercados regulamentados de valores mobiliários.

Essas alterações proporcionarão a redução de tempo, custo e riscos das operações, trazendo maiores utilidades para esse título de crédito.

Em que pese as alterações realizadas nos procedimentos empresariais sejam positivas para o ecossistema e traga desburocratização, por tratar-se de novas disposições, ainda será necessário acompanhar os próximos passos para analisar a efetiva melhora, razão pela qual ainda abordaremos esses assuntos, por isso, não deixe de acompanhar as nossas novas publicações!

 

*Lopes é CEO do Silva | Lopes Advogados e Mallet e Martins são integrantes do time do escritório.

 

PODCAST

Minha jornada: Tomás Duarte e o case Track.co