Migração de prestador de serviço para CLT: cuidados jurídicos

A pejotização ocasiona um alto passivo trabalhista para as empresas

Migração de prestador de serviço para CLT: cuidados jurídicos Migração de prestador de serviço para CLT: cuidados jurídicos

Por Tayrê Balzan, Lucas Euzébio e Layon Lopes*

A contratação de prestador de serviço (PJ) ao invés de empregado CLT tem sido costumeiramente utilizada pelas empresas para a diminuição dos encargos e aumento da remuneração dos funcionários. No entanto, a pejotização é causa de um relevante passivo trabalhista para as empresas de base tecnológica.

 

Conteúdo:

Qual a importância da migração de profissionais de pessoa jurídica (PJ) para o regime de Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)?

Quais cuidados jurídicos é preciso ter na migração?

E, quais são os aspectos tributários?

 

Tendo em vista que o uso de PJ em relações características de emprego CLT traz alto risco trabalhista para as empresas, a fim de evitar e minimizar os riscos existentes, as empresas podem realizar a migração de prestador de serviços para CLT. Assim, este artigo irá abordar os cuidados jurídicos existentes no processo de migração de prestador de serviço para CLT, com a explicação sobre a importância do tema, cuidadas existentes e aspectos tributários aplicáveis.

 

Qual a importância da migração de profissionais de pessoa jurídica (PJ) para o regime de Consolidação das Leis do Trabalho (CLT)?

A pejotização é a contratação de PJ em uma relação que possui os requisitos de uma relação de emprego CLT. Os requisitos de caracterização do vínculo empregatício são (i) a pessoalidade, que significa que o serviço deverá ser prestado pessoalmente pelo empregado não podendo este ser substituído por outro empregado; (ii) a não-eventualidade, na qual o contrato gera uma continuidade na prestação de serviço, não possuindo caráter meramente pontual; (iii) a subordinação, que remete a submissão às diretrizes do empregador, o qual determina o lugar, a forma, o modo e a execução das atividades, havendo clareza entre a parte que possui o poder de comando e a parte que possui a obrigação de cumprir aquilo que lhe é ordenado e; (iv) a não-onerosidade, a qual consiste no percebimento de uma remuneração em troca dos serviços prestados pelo empregado.

Os requisitos do vínculo trabalhista estão também estabelecidos no art. 3º da CLT que estabelece que é considerado empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. Sendo que, no art. 9º da CLT é trazido que serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na CLT.

A pejotização tem o objetivo de mascarar uma relação entre as partes que é tipicamente de emprego CLT, caracterizando em fraude trabalhista. A prática da pejotização é tema que já vem sendo reiteradamente decidido pela justiça trabalhista, a qual tem como consequência a condenação da empresa para o pagamento das verbas trabalhistas devidas durante a contratação. Em relação ao tema, aproveito para ressaltar julgados do TRT-4 (Rio Grande do Sul), TRT-2 (São Paulo) e TRT-12 (Santa Catarina) que decidiram sobre a pejotização:

PEJOTIZAÇÃO. FRAUDE COM O OBJETIVO DE MASCARAR RELAÇÃO DE EMPREGO. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS NULO. A pejotização se caracteriza como uma espécie fraudulenta de pactuação que coloca o empregado, ser individual, em posição vulnerável perante o empregador, ser coletivo. A proposta de contratação por CNPJ tem caráter manifesto de cláusula de adesão, já que, se o trabalhador não aquiescer, será substituído por outro que as aceite. Constatada a prática da pejotização, como no caso em apreço, o contrato de prestação de serviços autônomos entre as partes é nulo de pleno direito. Assim, e se encontrando preenchidos os requisitos do art. 3º da CLT, impõe-se a manutenção da sentença que reconheceu o vínculo empregatício e consectários decorrentes. Recursos ordinários desprovidos (TRT-2 – ROT: 10013571020205020036, Relator: LIANE MARTINS CASARIN, 3ª Turma)

EMENTA VÍNCULO DE EMPREGO. “PEJOTIZAÇÃO”. CARACTERIZADA. A “pejotização” tem sido utilizada pela doutrina e pela jurisprudência para se referir à contratação de serviços exercidos por pessoas físicas, de modo subordinado, não eventual e oneroso, realizada por meio de pessoa jurídica, na tentativa de burlar eventuais relações de emprego, sendo nula de pleno direito, na forma do art. 9o da CLT, por violar direitos constitucionalmente assegurados (art. 7o, Constituição Federal), bem como os princípios da dignidade da pessoa humana (art. 1o , III , Constituição Federal) e da valorização social do trabalho (art. 170 e 193 , Constituição Federal). No caso dos autos, restaram evidenciados os requisitos do vínculo de emprego, previstos nos arts. 2o e 3o da CLT. (TRT-4 – ROT: 00210907720195040611, Relator: BRIGIDA JOAQUINA CHARAO BARCELOS, Data de Julgamento: 02/05/2023, 8ª Turma)

VÍNCULO EMPREGATÍCIO. PEJOTIZAÇÃO Estando presentes os requisitos necessários ao reconhecimento do vínculo empregatício, quais sejam, pessoalidade, onerosidade, subordinação e não eventualidade, faz-se mister reconhecê-lo, nos termos do art. 3º da CLT, ainda que o trabalhador tenha constituído pessoa jurídica para ser contratado pela empregadora. (TRT-12 – ROT: 00000673020215120014, Relator: MARIA DE LOURDES LEIRIA, 1ª Câmara)

Nos julgados acima citados, é ressaltado sobre a prática de exigir dos empregados a constituição de empresas (pejotização) para viabilizar o exercício de uma atividade remunerada e subordinada. Sendo que, os fatos existentes na realidade, os documentos e as testemunhas comprovam a caracterização do vínculo trabalhista entre as partes. Assim, uma das consequências é a decretação da nulidade do contrato de prestação de serviços e o reconhecimento do vínculo empregatício na contratação.

Dessa forma, diante do entendimento doutrinário e jurisprudencial sobre o tema, para evitar passivos trabalhistas, é importante que as empresas realizem a contratação dos funcionários por CLT, para a realização da correta contratação de diminuição dos riscos existentes. 

 

Quais os cuidados jurídicos é preciso ter na migração?

Para a realização de uma migração de prestador de serviço para CLT, é importante que a empresa possua uma assessoria jurídica e uma contabilidade que realize o apoio para a migração. 

É importante que seja elaborado um plano de transição com prazos e metas claras sobre o processo que serão seguidos. A empresa deverá realizar o mapeamento dos funcionários, o organograma da empresa e a projeção dos custos para a transação, para ciência e reorganização. Assim como, deverá ser verificada a compatibilidade dos benefícios, remuneração e a definição de critérios objetivos para a seleção dos profissionais que serão incluídos na migração. 

Para a migração de prestador de serviço para CLT, é importante que a empresa contrate uma contabilidade que irá auxiliar com o processo. A contabilidade é uma peça fundamental para auxiliar a empresa na migração trabalhista, considerando todos os encargos trabalhistas e previdenciários que incidem nos salários dos colaboradores. Além disso, a contabilidade auxiliará no envio das informações fiscais e trabalhistas da empresa para o eSocial, objetivando a redução de eventuais multas por parte do Ministério Público do Trabalho.

O RH também é uma peça importante nesse processo, a qual irá auxiliar a empresa na estruturação organizacional interna, com a definição dos CBO’s de cada cargo, trabalhando diretamente com a contabilidade para o repasse de informações dos colaboradores. 

Além disso, é necessário que a empresa possua o devido auxílio jurídico durante todo o processo de migração de prestador de serviço para CLT, para auxiliar com a confecção dos documentos de rescisão dos contratos de prestação de serviços, com os novos contratos de trabalho aos colaboradores, assim como aos demais documentos e acompanhamento jurídico durante a migração. 

 

E, quais são os aspectos tributários?

Em se tratando do regime de PJ, na abertura da empresa, o PJ irá optar pelo tipo societário, sendo comum na pejotização a abertura de Microempreendedor Individual (MEI). Assim, na contratação de PJ, haverá a incidência dos impostos a qual o próprio PJ deverá adimplir, como por exemplo, a tributação do Simples Nacional. 

Já no regime CLT, haverá a incidência de todos os encargos trabalhistas e dos tributos, como Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), Previdência Social (INSS), Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF), 13° salário, férias e benefícios aplicáveis. A contratação CLT, apesar dos encargos mais elevados, oferece maior segurança para a empresa de que, cumprindo corretamente com suas obrigações, mitigará as condenações judiciais por inobservância das leis trabalhistas.

Portanto, a contratação via CLT apesar de não ser de imediato, a mais vantajosa financeiramente à empresa, é a mais segura que há, uma vez que obedece aos preceitos da lei que regula as principais normas de trabalho vigentes no país.

Ainda, ressaltamos que esta modalidade de contratação mitiga as chances de condenação da empresa perante a Justiça do Trabalho se comparada à contratação PJ. Ademais, a longo prazo, a contratação CLT também se torna mais vantajosa do ponto de vista financeiro para a própria empresa, em razão da mitigação dos riscos e da observação das normas. 

É importante ressaltar que o tema da migração de prestador de serviço para CLT pode envolver aspectos específicos da legislação trabalhista e tributária brasileira, bem como as particularidades de cada empresa e profissional envolvido. Por isso, é fundamental que as empresas contem com o suporte de especialistas em direito trabalhista e tributário para avaliar as melhores estratégias de planejamento e gestão de riscos.

Ademais, diante da questão fiscal incidente e comentada, reiteramos a importância da contratação e auxílio da contabilidade para a migração trabalhista dos colaboradores. Além disso, é necessário destacar que o processo de migração pode envolver aspectos importantes para a relação entre a empresa e seus colaboradores, exigindo um diálogo transparente e respeitoso para minimizar eventuais conflitos que possam surgir.

Importante mencionar que a questão trabalhista é por muitas vezes a questão definidora em operações M&A, operações essas que são muitas vezes parte do sonho e objetivo dos empresários. Em uma due diligence realizada na empresa, são verificadas as formas de contratações existentes na empresa, assim como demais riscos trabalhistas existentes. Assim, em uma empresa que possui contratos firmados apenas com PJ, em relações típicas de CLT, a área trabalhista pode significar um deal breaker na operação de M&A, em razão do alto passivo trabalhista que tal fato poderá ocasionar na venda da empresa.

Dessa forma, foi possível verificar que o processo de migração trabalhista envolve variados elementos que devem ser seguidos, de forma que é importante que a migração seja realizada com o devido auxílio jurídico para a diminuição de intercorrências durante o processo.  

Dúvidas sobre migração de prestador de serviço para CLT? A equipe do Silva Lopes Advogados pode te ajudar!

*Lopes é CEO do Silva Lopes Advogados, Euzébio é sócio e Balzan é integrante do time do escritório.

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil.