Por que operadoras de cartão de crédito não são Instituições Financeiras? Por que operadoras de cartão de crédito não são Instituições Financeiras?

Por que operadoras de cartão de crédito não são Instituições Financeiras?

Recente julgamento do Superior Tribunal de Justiça trouxe à tona essa dúvida muito comum

Por Daniela Froener e Layon Lopes*

No entendimento do Superior Tribunal de Justiça e do Banco Central do Brasil (Bacen) (REsp nº 1.359.624, publicado em 26/06/2020), empresas operadoras/administradoras de cartão de crédito não são Instituições Financeiras, pois, não financiam seus clientes com recursos próprios. Em verdade, quando um cliente não paga a fatura, seja totalmente ou parcialmente, a operadora/administradora de cartão de crédito (que é típica Instituição de Pagamento), em nome do cliente devedor, busca junto à Instituição Financeira parceira o crédito necessário para a quitação da fatura.

Inicialmente, relembro que já foi objeto de muitos artigos aqui no Startuplife a questão acerca do que são Instituições de Pagamentos. Então, uma empresa operadora/administradora de cartão de crédito é, justamente, uma modalidade de Instituição de Pagamento, tipo de empresa diferente de uma Instituição Financeira. 

E são diferentes por força de lei, senão vejamos: 

Nos termos da lei (nº 4.595/1964), consideram-se Instituições Financeiras as pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros. 

Nos termos da lei (nº 12.865/2013), consideram-se Instituições de Pagamentos a pessoa jurídica que, aderindo a um ou mais arranjos de pagamento, tenha como atividade principal ou acessória, alternativa ou cumulativamente: a) disponibilizar serviço de aporte ou saque de recursos mantidos em conta de pagamento; b) executar ou facilitar a instrução de pagamento relacionada a determinado serviço de pagamento, inclusive transferência originada de ou destinada a conta de pagamento; c) gerir conta de pagamento; d) emitir instrumento de pagamento (cartão de crédito); e) credenciar a aceitação de instrumento de pagamento; f) executar remessa de fundos; g) converter moeda física ou escritural em moeda eletrônica, ou vice-versa, credenciar a aceitação ou gerir o uso de moeda eletrônica; e h) outras atividades relacionadas à prestação de serviço de pagamento, designadas pelo Bacen.

Ainda, a mesma lei expressamente vedou às Instituições de Pagamento a realização de atividades privativas de Instituições Financeiras. Logo, temos que os tipos de empresa não se confundem. 

Agora, você sabe como funcionam as operações com cartões de crédito?

Então, os cartões de crédito surgiram nos Estados Unidos, no início do século XX, primeiramente como cartões de credenciamento em lojas de departamentos, evoluindo, com o surgimento do Diners Club, para cartão de crédito como conhecemos hoje: instrumento de concessão de crédito mais seguro e de maior aceitação do que o cheque.

As operações havidas com  esse recurso ocorrem mediante a ação de três partes distintas, senão vejamos:

1) Instituição de Pagamento emissora de instrumento de pagamento (cartão de crédito): também chamada de “operadora” ou “administradora”, a Instituição de Pagamento emissora de instrumento de pagamento é quem faz a intermediação entre: (a) fornecedores de bens e serviços (estabelecimentos comerciais que aceitam os cartões de crédito emitidos); (b) empresas financeiras; e, (c) os titulares dos cartões (clientes que utilizam os cartões de crédito para fazerem compras nos estabelecimentos comerciais). 

Além dessa intermediação, as Instituição de Pagamento também são encarregadas de pagar os fornecedores de bens e serviços (estabelecimentos comerciais) pelas transações havidas com os cartões de crédito que emitiu, percebendo, por isso, uma comissão, além de taxas eventualmente cobradas pela emissão do cartão de crédito aos clientes. 

2) Estabelecimento Comercial: são os fornecedores de bens e serviços que aceitam os cartões de crédito emitidos para efetuar transações de pagamentos, formando uma rede de estabelecimentos credenciados, recebendo o pagamento das compras havidas pelos clientes com os cartões de crédito diretamente da Instituição de Pagamento emissora do cartão de crédito, mediante pagamento de comissão.

Nessa hipótese é levado em consideração que a Instituição de Pagamento emissora do cartão de crédito foi a mesma emissora do cartão de crédito que credenciou o Estabelecimento Comercial. Caso contrário, teríamos a participação de mais uma parte: a Instituição de Pagamento Credenciadora. 

3) Titulares de cartões de crédito: clientes da Instituição de Pagamento emissora do cartão de crédito. 

Logo, como podemos perceber, a Instituição de Pagamento emissora do cartão de crédito é quem figura como devedora perante o Estabelecimento Comercial, apesar da compra do bem ou do serviço ter sido feita pelo cliente titular do cartão de crédito.  Ainda, em havendo uma Instituição de Pagamento Credenciadora na operação, é essa que figurará como devedora perante o Estabelecimento Comercial e credora perante a Instituição de Pagamento emissora do cartão de crédito. 

Nesse cenário, quando a Instituição de Pagamento emissora do cartão de crédito é controlada por Instituição Financeira, normalmente, aquela contrata empréstimos com essa, para garantir o pagamento dos Estabelecimentos Comerciais, logo, podemos afirmar que são utilizados “recursos próprios”. Porém, no caso de se tratar de Instituição de Pagamento emissora do cartão de crédito não controlada por Instituição Financeira, a Instituição de Pagamento emissora do cartão de crédito obtém crédito, em nome do cliente inadimplente, junto à Instituição Financeira parceira, para honrar o débito junto ao Estabelecimento Comercial. Assim, a Instituição de Pagamento emissora do cartão de crédito funciona como intermediária de operação financeira.

Em outras palavras: a Instituição de Pagamento emissora do cartão de crédito faz a intermediação entre seu cliente inadimplente e a Instituição Financeira parceria, para fins de cobertura da fatura não adimplida em sua totalidade, não tendo controle sobre a taxa de juros aplicada e não participando da operação financeira em si. 

Corroborando este entendimento, o Bacen defende que existem dois tipos de instituições que podem emitir cartões de crédito, quais sejam: (a) Instituições Financeiras, que emitem e administram cartões próprios ou de terceiros e concedem financiamento direto aos titulares; e, (b) empresa (Instituição de Pagamento) emissora do cartão de crédito, que não são empresas financeiras, emitem e administram cartões próprios ou de terceiros, e não financiam os titulares. 

Em havendo o inadimplemento parcial ou total da fatura, a Instituição de Pagamento emissora do cartão de crédito não utiliza recursos próprios para honrar os pagamentos aos credores (Estabelecimentos Comerciais), mas sim busca recursos junto às Instituições Financeiras parceiras para essa finalidade, em nome do cliente (titular do cartão), sendo essa operação uma mera intermediação que não tem natureza financeira, pois, é a Instituição Financeira parceira que concede o crédito necessário ao adimplemento da fatura de cartão de crédito, passando o cliente da fatura a figurar como devedor. 

Assim, é possível concluir que a intermediação operada pela Instituição de Pagamento emissora do cartão de crédito não tem natureza financeira, pois, a Instituição de Pagamento não capta recursos de forma direta junto aos investidores no mercado financeiro, tal como faz uma Instituição Financeira no exercício da sua atividade privativa, mas apenas representa o seu cliente junto a uma Instituição Financeira para obter o crédito necessário para o adimplemento das faturas do cartão de crédito inadimplido.

Feitas tais considerações, resta claro que, as empresas emissoras do cartão de crédito não são financeiras.

Dúvidas? A equipe do Silva | Lopes Advogados pode te ajudar.

*Lopes é CEO do Silva | Lopes Advogados e Froener é COO do escritório.

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