Home office: A CCT aplicável aos colaboradores Home office: A CCT aplicável aos colaboradores

Home office: A CCT aplicável aos colaboradores

Impulsionada pela pandemia, a modalidade home office tornou-se uma realidade no cotidiano de diversas empresas e de seus colaboradores

Por Renan Raffo e Layon Lopes*

“Qual a CCT aplicável aos colaboradores em home office?”. Esta tem sido uma pergunta frequente em departamentos jurídicos e administrativos de diversas companhias. Impulsionado à força pela pandemia, o regime de home office tornou-se uma realidade no cotidiano de diversas empresas e de seus colaboradores – e, ao que tudo indica, a modalidade deve manter presença nas relações de trabalho de forma definitiva. Ocorre que, junto a este novo contexto laboral, surgem diversas dúvidas e incertezas, do ponto de vista jurídico, acerca do tratamento que deve ser dispensado aos colaboradores que atuam em home office – isto porque não há, ainda, maior regulamentação legal sobre o tema. Neste sentido, um dos maiores desafios a ser enfrentado é, justamente, o que trata da Convenção Coletiva de Trabalho (CCT) aplicável aos colaboradores em home office que estejam situados em localidades distintas à da sede da empresa.

A legislação trabalhista, em regra, estipula que o enquadramento sindical de uma empresa e de seus colaboradores se dará por critérios relativos, por um lado, à atividade econômica principal desenvolvida pela companhia; e, por outro, pelo princípio da territorialidade – isto é, a CCT que deverá ser observada pela empresa é aquela que tenha sido celebrada pelos sindicatos de sua categoria que possuam a abrangência e competência territorial sobre o município onde está localizada a sede da empresa. 

No entanto, a própria legislação trabalhista determina, a partir da interpretação do art. 611 da CLT, que, na hipótese de que trabalhadores que prestem serviços em localidade distinta à da sede da empresa, a estes deve ser aplicada a CCT que tenha sido celebrada pelos sindicatos que possuam competência territorial específica sobre o local onde são prestados os serviços. Ou seja, caso uma empresa esteja sediada na cidade de São Paulo/SP, mas tenha algum colaborador contratado para desempenhar suas funções em Porto Alegre/RS, a ele deverá ser aplicada a CCT da categoria com abrangência territorial sobre o município de Porto Alegre. 

Seguindo esta lógica, será que, quando pensamos na realidade dos colaboradores que, em decorrência do home office, estejam trabalhando em localidade distinta à da sede da empresa, a eles deverá ser aplicada a CCT com abrangência sobre o município de sua residência? Deveriam, então, as empresas que possuem diversos colaboradores em home office, trabalhando a partir das mais distintas localidades em todo o país, observar as CCTs com abrangência sobre cada uma destas localidades para cada colaborador em específico? Embora não haja, ainda, disciplina legal ou jurisprudencial suficientemente vinculantes sobre o tema, entende-se que não. 

Isto porque, em primeiro lugar, a legislação trabalhista não está adequada à nova realidade das relações de trabalho – e, especialmente, ao home office. No que se refere ao aspecto da territorialidade, ao determinar que o local da prestação de serviços do trabalhador determina a sua vinculação sindical, foi pensada para contemplar aqueles trabalhadores que, por determinação da empresa ou por necessidade específica de suas atividades, tenham sido contratados ou transferidos para outra cidade/estado para desempenhar as suas funções – o que, efetivamente, não é o caso de quem atua em regime de home office. Ademais, a própria CLT é explícita ao determinar que o regime de teletrabalho não configura “trabalho externo”, o que nos leva à interpretação de que, ainda que o colaborador esteja vivendo e trabalhando em outra cidade, para os fins da relação laboral, deve-se considerar como se estivesse atuando na sede da empresa – pois é de lá que advém a gestão do seu contrato de trabalho, as orientações acerca das atividades que deve desenvolver e, ainda, é diretamente para lá que o trabalho é executado.  O fato de o colaborador, eventualmente, estar situado em outra localidade, nesta hipótese, não se dá por qualquer necessidade específica relacionada à relação de trabalho ou ao exercício de suas funções – ao contrário, em geral, ocorre, inclusive, por um aspecto de maior comodidade para o próprio colaborador. 

Ainda, para além do aspecto jurídico, outro ponto não menos importante diz respeito à possibilidade de que, administrativamente, as empresas tenham condições de, simultaneamente, observar uma quantidade tão diversa de CCTs, com disposições completamente discrepantes entre si, para cada colaborador. Não há dúvidas de que, na grande maioria das empresas, não existe estrutura suficiente para a realização deste acompanhamento, tornando inviável qualquer prática desta natureza.

Portanto, parece evidente que, para os casos específicos de trabalhadores que estejam atuando sob o regime de home office, deve ser mitigado o princípio da territorialidade e lhes deve ser aplicada a CCT com abrangência territorial sobre a localidade onde está situada a empresa, e não a do domicílio do colaborador. Certamente, a falta de legislação ou de jurisprudência vinculante sobre o assunto gera algumas dúvidas sobre o entendimento que os tribunais passarão a adotar ao, inevitavelmente, em breve, enfrentar esta matéria. No entanto, através de uma interpretação sistêmica do cenário, bem como por uma questão de razoabilidade, este é, sem dúvidas, o caminho mais seguro e viável a ser seguido.

Dúvidas? A equipe do Silva| Lopes Advogados pode te ajudar!

 

*Lopes é CEO do Silva | Lopes Advogados e Raffo é integrante do time.

 

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