O que são ICOs? O que são ICOs?

O que são ICOs?

Os ICOs têm como objeto a oferta dos chamados “coins” ou “tokens”

Por Gustavo Chaves Barcellos e Layon Lopes*

Os avanços tecnológicos invadiram todos os aspectos da vida humana em sociedade, modificando desde a forma como nos relacionamos, contratamos e até mesmo investimos. Neste sentido, desde 2017, um inovador veículo de investimento vem ganhando destaque: ICO (Initial Coin Offering). 

Mais de US$ 5 bilhões foram captados apenas no ano de 2017 por meio de ICOs, o que representou 435 ofertas de tokens, sendo que, apenas 10 delas captaram um valor total de US$ 1,3 bilhões de dólares

Mas, afinal, o que são ICOs?

Segundo a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), ICOs são captações públicas de recursos, tendo como contrapartida a emissão de ativos virtuais, também conhecidos como tokens ou coins, em favor do público investidor. Tais ativos virtuais, por sua vez, a depender do contexto econômico de sua emissão e dos direitos conferidos aos investidores, podem representar valores mobiliários, nos termos do art. 2º da Lei 6.385/76.

Dois fatores relativos aos ICOs são apontados como inovadores pelo órgão regulador: Em primeiro, os ICOs são investimentos realizados sempre através de plataformas digitais, o que facilita a captação de recursos mediante a transferência de criptoativos ou de moedas fiduciárias. Em segundo lugar, tal digitalização do processo de investimento utiliza conceitos tecnológicos como blockchain, criptografia, programação lógica, protocolos de rede de computadores descentralizados e tecnologias de registro distribuído (distributed ledger tecnology – DLT), o que, em tese, possibilita maior velocidade e precisão de registros.

Em suma, os ICOs têm como objeto a oferta dos chamados “coins” ou “tokens”, sendo que o pagamento realizado pelos investidores se dá através da entrega de ativos virtuais (Bitcoin, por exemplo). As transações são realizadas em plataformas totalmente pulverizadas, sustentadas pelo conceito tecnológico do blockchain, sem intermediários. 

No que tange às espécies de ICOs, a CVM dá uma atenção maior aos:

(i) Utility Tokens: A emissão de “utility tokens” ocorre quando o ativo virtual emitido confere ao investidor acesso à plataforma, projeto ou serviço, nos moldes de uma licença de uso ou de créditos para consumir um bem ou serviço. Um exemplo seria o Bitcoin

(ii) Security Tokens: De acordo com comunicado oficial por parte da CVM, em certos casos, os ativos virtuais emitidos no âmbito de ICOs podem claramente ser compreendidos como algum tipo de valor mobiliário, principalmente quando conferem ao investidor, por exemplo, direitos de participação no capital ou em acordos de remuneração pré-fixada sobre o capital investido ou de voto em assembleias que determinam o direcionamento dos negócios do emissor. Este é justamente o caso dos Security Tokens, pois representam uma captação de recursos junto ao público, concedendo aos seus adquirentes direitos típicos de acionistas de companhias (semelhante a uma ação). 

Neste sentido, o que irá determinar se um token é ou não um valor mobiliário é o contexto econômico de sua emissão quanto aos direitos conferidos aos respectivos investidores. Quando ele for um valor mobiliário, há alguns procedimentos a serem observados antes da realização de um ICO, quais sejam:

A Instrução CVM 400 estabelece que a “distribuição de valores mobiliários nos mercados primário e secundário, no território brasileiro, dirigida a pessoas naturais, jurídicas, fundo ou universalidade de direitos, residentes, domiciliados ou constituídos no Brasil, deverá ser submetida previamente a registro na Comissão de Valores Mobiliários”.

Ainda, o parágrafo 1º, artigo 4º, da Lei 6.404/76, estipula que somente os valores mobiliários de emissão de companhia registrada na Comissão de Valores Mobiliários podem ser negociados em mercados secundários de valores mobiliários, com o intuito de fornecer à CVM e ao público um conjunto de informações de interesse de potenciais investidores e assegurar a transparência das informações referentes ao emissor.

O acesso do público investidor aos mercados regulamentados, bem como a negociação de tais valores mobiliários, deve ser feita por meio de intermediários autorizados pela CVM (corretoras e distribuidoras de valores mobiliários – vide Instrução CVM 505), os quais devem atentar para as exigências de prevenção à lavagem de dinheiro (Instrução CVM 301) e para a adequada identificação do perfil do investidor (Instrução CVM 539), utilizando infraestrutura de mercado autorizada pela CVM. 

Portanto, se a oferta de tokens restar caracterizada como oferta de valores mobiliários, ela deverá atender às regulações da CVM, sob pena de ser considerada irregular e, como tal, estará sujeita às sanções e penalidades aplicáveis. 

Sendo assim, as empresas que prestam serviços de negociação, pós-negociação e custódia de ativos virtuais (as chamadas exchanges) – as quais via de regra não são autorizadas da CVM – se vierem a gerir ativos que se enquadrem como valores mobiliários, deverão buscar os registros devidos para o exercício das suas atividades citadas junto à CVM.

Diante deste instável cenário, é importante que as exchanges adotem prontamente uma Política de Compliance, a fim de mitigar os riscos inerentes às operações envolvendo ICOs. Ademais, segundo a própria CVM, em que pese a ausência de exigência específica, diversos ICOs utilizam como ferramentas de amparo reputacional estratégias tais como a publicação de seus códigos-fonte, a divulgação de que houve auditoria independente de seus códigos-fonte e a divulgação de opiniões de supostos especialistas técnicos a respeito da oferta e do projeto em questão.

Por fim, há de se atentar para os riscos apontados pela CVM quanto à participação de potenciais investidores em operações de ICOs:

(i) Risco de fraudes e pirâmides financeiras;

(ii) Inexistência de processos formais de adequação do perfil do investidor ao risco do empreendimento (suitability);

(iii) Risco de operações de lavagem de dinheiro e evasão fiscal/divisas;

(iv) Prestadores de serviços atuando sem observar a legislação aplicável;

(v) Material publicitário de oferta que não observa a regulamentação da CVM;

(vi) Riscos operacionais em ambientes de negociação não monitorados pela CVM;

(vii) Riscos cibernéticos (dentre os quais, ataques à infraestrutura, sistemas e comprometimento de

credenciais de acesso dificultando o acesso aos ativos ou a perda parcial ou total dos mesmos) associados à gestão e custódia dos ativos virtuais;

(viii) Risco operacional associado a ativos virtuais e seus sistemas;

(ix) Volatilidade associada a ativos virtuais;

(x) Risco de liquidez (ou seja, risco de não encontrar compradores/vendedores para certa quantidade de ativos ao preço cotado) associado a ativos virtuais; e,

(xi) Desafios jurídicos e operacionais em casos de litígio com emissores, inerentes ao caráter multijurisdicional das operações com ativos virtuais.

Conclui-se, portanto, que os ICOs denotam uma volatilidade muito grande no que tange a sua regulação ou não por parte da CVM, em que pese as evidentes facilidades que este veículo de investimento traz ao mercado. De qualquer forma, a postura adotada pela própria CVM em relação aos avanços tecnológicos ocorridos nos últimos anos denota que ela está atenta a tais avanços e busca ouvir os players envolvidos do mercado para redigir suas regulações. 

Por ora, é recomendável a todos aqueles que busquem investir através de ICOs que verifiquem no site da CVM se a instituição ofertante e a oferta em si estão ou não registradas. A própria autarquia está aberta a responder consultas sobre ofertas registradas, bem como investigar denúncias e reclamações sobre possíveis irregularidades. 

Dúvidas? A equipe do Silva | Lopes pode te ajudar.

*Lopes é CEO do Silva | Lopes Advogados e Barcellos é integrante do time do escritório.

 

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