Por Lucas Euzébio e Layon Lopes*
A sociedade entre cônjuges está prevista no Código Civil Brasileiro, vigente desde o ano de 2002. Antes da entrada em vigor do novo código civil em 2002, estava vigente no Brasil o Código Civil do ano de 1916, onde a mulher não era equiparada ao homem, o que gerava certa divergência entre a doutrina sobre a possibilidade de marido e mulher constituírem uma sociedade, seja ela uma sociedade empresária ou uma sociedade simples. Este cenário apenas mudou no Brasil em 1988 com a promulgação da Constituição Federal, chamada “Constituição Cidadã”.
Quando tratamos de sociedade entre cônjuges e, aqui importante destacar de início, que a figura de cônjuges não se limita apenas a figura matrimonial entre homem e mulher, precisamos estar atentos a diversos pontos no Direito, analisando a temática de maneira macro, não apenas no que toca o Direito de Família, mas também o Direito Societário, Sucessório, entre outros que veremos a seguir.
A sociedade entre cônjuges é legal e está disciplinada no artigo 977 do Código Civil, que diz o seguinte:
Art. 977. Faculta-se aos cônjuges contratar sociedade, entre si ou com terceiros, desde que não tenham casado no regime da comunhão universal de bens, ou no da separação obrigatória.
Analisando a previsão legal, é possível extrair que o legislador limita a figura da sociedade entre cônjuges quando retira a possibilidade da constituição para o casal que tenha optado pelo regime de comunhão universal de bens ou da separação obrigatória. Vale ressaltar, que no Brasil existem três tipos de regimes de bens: o de comunhão parcial de bens, onde todos os bens adquiridos a partir do casamento fazem parte do patrimônio do casal; o da comunhão universal, onde todos os bens, sejam eles adquiridos antes ou após o casamento, são bens comuns do casal; e a separação total de bens, onde, mesmo após o casamento, os bens de cada cônjuge continuam a compor apenas o seu patrimônio individual.
Logo, se os cônjuges são casados no regime de comunhão total de bens, eles não podem contrair sociedade, pois, na visão do legislador, todos os bens fazem parte de um único patrimônio, não havendo como individualizar a contribuição que cada sócio vai dar para a sociedade, lembrando sempre que quotas e/ou ações, são patrimônio exclusivo do sócio.
Já no caso do regime de separação total de bens, caso os cônjuges constituíssem sociedade, esses bens acabariam por se unir em razão do contrato social. Portanto, a opção para os cônjuges é a escolha pelo regime de comunhão parcial de bens, que, na prática, é o que acontece na maioria dos casos.
A opção do legislador em restringir a sociedade entre cônjuges tendo como parâmetro o regime de bens, é questionável, existindo dois posicionamentos dominantes: o entendimento do legislador tem o fito de evitar a confusão patrimonial e, principalmente que os sócios, de certa forma, burlem o seu regime de bens e/ou com o intuito de fraudar credores.
Atualmente, muito se fala em Holding Patrimonial para, principalmente, blindagem patrimonial e questões sucessórias.
Do outro lado do entendimento do legislador, existe o posicionamento de que a escolha do legislador é, possivelmente, inconstitucional, pois afronta a livre iniciativa e o princípio da liberdade de associação, estabelecidos nos artigos 1º, inciso IV, artigo 5º, inciso XVII e artigo 170, todos da Constituição Federal de 1988.
Ainda neste raciocínio, a proibição do legislador se mostra, na prática, pouco eficaz para combater eventuais fraudes, existindo outras maneiras no ordenamento jurídico para impedir ou reparar lesões a um direito, sem prejuízo a livre iniciativa e o direito de associação. Basta pensar no instituto da união estável, já reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), a qual, a depender do caso, pode se equiparar ao matrimônio, onde, na maioria das vezes será reconhecido o regime de comunhão parcial de bens.
Por isso, é importante destacar o quão essencial é que o acordo de sócios seja bem redigido e que se tenha um contrato social adequado para estes casos, tendo em vista que as quotas e/ou ações, são patrimônios de cada sócio, podendo, em caso de um processo de divórcio. Como por exemplo, o sócio ter que ceder um percentual de seu patrimônio, como usualmente acontece.
Portanto, salientamos que não apenas os cônjuges devem se precaver, mas sim todos os sócios, em pontos como: o direito de preferência de aquisição destas quotas, o valor a ser pago, a critério de avaliação a ser utilizado – será o balanço patrimonial especial ou um critério específico para o valuation ?- , número de parcelas, entre outros. Estes pontos estratégicos podem afetar diretamente os planos da sociedade, não sendo incomum – infelizmente – casos onde não se dá a devida atenção a eles, levando a sociedade quase a insolvência, a contratação de empréstimos para comprar a parte de algum sócio que está passando por um divórcio, ou ainda, a parte que terá preferência de compra, a fim de evitar o ingresso de um terceiro estranho na sociedade.
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* Lopes é CEO do Silva | Lopes Advogados e Euzébio é integrante do time do escritório.