Por Gustavo Chaves Barcellos e Layon Lopes*
Que a Europa, há bastante tempo, está em uma ebulição social, econômica e política não é novidade para ninguém. As mudanças dos modelos econômicos, das ideologias dominantes e a crise imigratória são apenas alguns sintomas deste momento histórico.
O mais recente episódio desta efervescência foi a saída do Reino Unido da União Europeia (“UE”), ocorrida no dia 31 de janeiro neste ano. Mas, você sabe o que isto significa, caro leitor? Sabe quais são os efeitos para as empresas brasileiras? Ou ainda, mais especificamente, para as empresas de tecnologia brasileiras?
Não? Pois bem, vamos analisar alguns conceitos básicos para facilitar o seu entendimento:
O que é o Brexit?
É o termo utilizado para falar sobre a decisão do Reino Unido de deixar a UE que, por sua vez, é um grupo econômico formado por 28 países que viabiliza a livre circulação de pessoas e mercadorias, bem como adota uma única moeda (o Euro). O Reino Único ingressou neste grupo em 1973, à época denominado Comunidade Econômica Europeia.
Quais são as razões pelas quais fizeram o Reino Unido deixar a UE?
As razões que deram origem ao movimento de saída do Reino Unido da UE remontam diversos momentos históricos do país e do próprio bloco. Desde o seu ingresso, o Reino Unido sempre manteve ressalvas quanto a adoção de algumas medidas impostas pela UE, exemplificativamente, sabe-se que ele jamais adotou o Euro como sua moeda.
Ainda, o Reino Unido, ao lado de outros países como França e Alemanha, por algumas vezes teve que suportar um pesado fardo decorrente das crises econômicas e imigratórias advindas dos países “menores” do bloco, o que levou a um descontentamento interno de alguns partidos políticos e de parte de sua população.
Quais são as condições de saída do Reino Unido da UE?
Dentre elas, podemos destacar os seguintes motivos: (i) criação de uma barreira alfandegaria entre o Reino Unido e a Irlanda do Norte (membro ativo da UE); (ii) os direitos dos cidadãos da UE no Reino Unido e dos cidadãos britânicos na UE permanecerão os mesmos durante o chamado “período de transição” (começa a partir da data do Brexit, 31/01/2020, e vai até o dia 31/12/2020); (iii) o Reino Unido deverá pagar à UE o valor equivalente a R$ 170 bilhões pela saída; (iv) durante o período de transição o Reino Unido deverá continuar seguindo todas as regras previstas na legislação da UE; (v) ainda, durante o período de transição, Reino Unido e UE deverão negociar um novo acordo de livre comércio, sendo que alguns pontos ainda ficarão pendentes, dentre eles questões policiais, de segurança, de aviação, de pesca, de fornecimento de gás e de licenciamento de medicamentos.
Mas o que muda, efetivamente para o Brasil? No intuito de mensurar quais mudanças o Brexit irá acarretar, bem como de qualificar os efeitos de tais mudanças, a Embaixada do Brasil em Londres e a Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex) lançaram uma plataforma que promete monitorar futuras mudanças tarifárias e logísticas, além de novas exigências alfandegárias e legais. Sete entre dez das empresas que responderam aos questionamentos feitos através da plataforma entendem que os efeitos do Brexit para os interesses brasileiros serão negativos.
Isso porque a saída do Reino Unido do bloco europeu, provavelmente, acarretará num aumento dos custos e da burocracia em negócios no país celebrados por empresas brasileiras. Dentre os referidos aumentos, pode-se citar gastos como a ampliação de gastos logísticos e alfandegários, maior carga tributária, entraves relacionados às exportações via Europa, exigências de novos certificados e imposição de barreiras tarifárias e não tarifárias.
Ocorre que, na realidade, a mensuração exata dos impactos do Brexit para as pretensões brasileiras só será possível quando a UE e o Reino Unido finalizarem os termos de saída.
Em um cenário otimista, onde o Reino Unido mantenha sua proximidade ao livre mercado europeu, especialistas apontam que o Brasil poderá ter ganhos de até € 1,7 bilhão.
De outro lado, em um cenário negativo, onde o Reino Unido faça uma ruptura total do bloco europeu, um estudo do Instituto Halle de Pesquisa Econômica (IWH), da Alemanha, calculou que quase 10 mil trabalhadores em território brasileiro poderiam ser afetados em dezenas de setores ligados às exportações, principalmente na agricultura, atividade em que o país se destaca como o maior fornecedor da União Europeia.
Para as empresas de tecnologia brasileiras que exportam os seus serviços para o Reino Unido, levando-se em conta a política econômica brasileira atual – mais alinhada ao livre comércio e à desburocratização no comércio exterior – é possível traçar um panorama positivo. Tal afirmação justifica-se porque, sem os entraves impostos pela negociação coletiva dos países da UE, o Reino Unido poderá desenvolver novas relações comerciais, incluindo tratados de livre comércio.
Outro fator positivo que poderia ser elencado é que, fora da UE, o Reino Unido estará pressionado a renegociar parte de suas relações comerciais, a fim de demonstrar os resultados positivos do Brexit, estando, desta forma, aberto a renegociar condições comerciais com o Brasil, o que poderia ser benéfico às empresas nacionais de tecnologia.
Por fim, do ponto de vista da Governança de Dados, os provedores de tecnologia brasileiros que, eventualmente, atuam no Reino Unido, se faz necessário um alerta: A General Data Protection Regulation (“GDPR”) continua aplicável à operação de tratamento de dados.
Tal fato explica-se porque: (i) o Reino Unido, durante o período de transição referido anteriormente, estará submetido à legislação do bloco europeu, e; (ii) a GDPR tem aplicação extraterritorial, ou seja, a regulamentação é aplicável mesmo fora do território da UE, desde que os dados objeto de tratamento sejam de titularidade de cidadãos europeus.
Ainda é cedo para ser categórico quanto aos efeitos do Brexit para as empresas de tecnologia brasileira, mas fato é que, se está diante de um novo cenário econômico, o qual acarretará, inevitavelmente, novas possibilidade comerciais, seja pelas necessidades do Reino Unido, seja pelas pretensões do empresariado nacional.
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*Lopes é CEO do Silva | Lopes Advogados e Barcellos é integrante da equipe do escritório.