Earn-out: como funciona?

Quando bem estruturada e negociada, a cláusula de earn-out poderá servir como um importante instrumento na operação de M&A

Earn-out: como funciona? Earn-out: como funciona?

Por João Benz, Lucas Euzébio e Layon Lopes*

O processo de um M&A, expressão oriunda do inglês “Mergers and Acquisitions”, que, traduzido ao português, designa as operações societárias de “Fusões e Aquisições” de empresas, inclui um complexo processo contratual com reflexos em todas as áreas de ambas as empresas (compradora e vendedora), desde a parte societária, propriedade intelectual, trabalhista, tributária e, até mesmo, aspectos regulatórios.

As transações de M&A são viabilizadas através de diversos tipos de reestruturações empresariais, sendo as mais comuns: fusões, incorporação, cisão (parcial ou total) e aquisição. Cabe mencionar que o tema é regulado especificamente pela Lei das Sociedades Anônimas (Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976) e pelo Código Civil (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002).

 

Conteúdo:

Earn-out: O que é? Como apurar?

Quais os benefícios da cláusula de earn-out?

Como calcular o valor a ser pago através da métrica de earn-out?

 

Os reflexos de operações de M&A ocorrem de diversas formas, causando, inclusive, impacto social direto, que é possível perceber que mesmo pessoas que não possuem formação jurídica, nem jamais empreenderam, já se depararam com este termo, ao ouvi-lo nas rodas de conversas de amigos ou conhecidos, no próprio trabalho, na TV, no jornal ou nas redes sociais. 

As operações de M&A são formalizadas através de um instrumento jurídico que estabelece os deveres, obrigações e condições de fechamento dentro da operação pretendida: o SPA (Shareholder Purchase Agreement). Dentre as principais cláusulas que podem ser incluídas em um SPA, a depender da natureza da operação pretendida, destaca-se a métrica conhecida como “earn-out”. 

 

 

Earn-out: O que é? Como apurar?

A métrica conhecida como “earn-out” nada mais é do que uma parcela variável do preço a ser recebido pela empresa objeto da compra, paga de acordo com os resultados obtidos da empresa objeto da compra, após o fechamento da operação de M&A. 

Ou seja, desta maneira, caso a empresa que foi objeto da venda consiga o cumprimento de determinadas metas após a conclusão da operação de M&A, os vendedores podem receber valores adicionais, como bonificação pelo bom desempenho da empresa no momento pós-venda. 

Quando é adicionada uma cláusula de earn-out ao contrato de compra e venda da empresa em questão, o pagamento será dividido em uma quantia inicial e uma quantia variável, é baseada no desempenho futuro da empresa adquirida. Esse desempenho pode ser medido por meio de diversas métricas financeiras, como ganho de receita, obtenção de lucro ou crescimento de vendas.

Durante as negociações, quando o Comprador tem interesse que os Vendedores (pessoas físicas) sigam na operação da Sociedade Alvo após a venda e quando não se chega a um consenso sobre o preço do negócio objeto da operação de M&A, é bastante comum que o earn-out seja proposto como forma de resolução do impasse sobre o preço da operação.

Sugere-se, adicionalmente, que as métricas que liberem a parcela variável do earn-out sejam claras e objetivas, a fim de mitigar as possibilidades de conflitos e reduzir a possibilidade de dupla interpretação sobre o eventual cumprimento de determinada métrica. 

Para o atingimento de tais metas, que representam uma parcela adicional sobre o preço a ser recebido pela empresa vendida, é de praxe que os sócios se mantenham na operação por um período determinado. Desta forma, complementando a cláusula de earn-out, pode-se adicionar ao SPA do M&A um período de lock up de um ou mais sócios fundadores da empresa. 

O lock up se trata do período determinado em que os sócios se comprometem a permanecer na operação da empresa. O principal intuito de se adicionar uma cláusula de lock up ao instrumento de compra e venda da empresa em questão é garantir que o cotidiano desta empresa não sofra efeitos bruscos por conta da perda repentina de uma ou mais pessoas chaves para a continuidade do negócio. 

Vale frisar que, assim como o earn-out, a cláusula de lock up não é obrigatória na formalização de compra e venda de empresas, podendo ser negociada entre as partes envolvidas para garantir a estabilidade e a segurança da transação. Via de regra, o efeito prático da quebra antecipada da cláusula de lock up envolve o pagamento de multa, por parte do sócio infrator, sem prejuízo de que ele arque com demais perdas e danos eventualmente ocasionadas por conta de sua saída antecipada da operação ou gestão da empresa.

Desta maneira, estabelecendo uma relação direta, recomenda-se que todos os sócios com potencial de auxiliar ou mesmo definir o sucesso do cumprimento das metas especificadas na cláusula de earn-out fiquem na condução do negócio por determinado período de termo, conforme formalização a ser feita na cláusula de lock up

Outros cuidados adicionais que são importantes de serem mencionados são a existência de prazo fixo, razoável e possível para o cumprimento das metas impostas, bem como a especificação de regras objetivas, que auxiliem no entendimento de que as metas foram efetivamente cumpridas. É comum, ainda, a presença de uma disposição prevendo a exigência de auditoria externa caso não haja consenso entre comprador e vendedor sobre o cumprimento de determinada meta. 

 

 

Quais os benefícios da cláusula de earn-out?

Embora a cláusula de earn-out possa, em primeiro momento, ser entendida como uma métrica utilizada quando há desconfiança da compradora no atingimento de metas por parte da empresa objeto da compra, a cláusula de earn-out, em verdade, pode ser utilizada como uma espécie de estímulo ao cumprimento das metas impostas. 

Desta maneira, ocorrendo a vinculação de pagamentos adicionais ao desempenho da empresa no cumprimento de suas metas, a métrica serve como incentivo, especialmente aos sócios fundadores, se estes continuarem na condução do negócio. Estes sócios, em havendo uma métrica de earn-out, devem se manter interessados no sucesso da empresa, haja vista que podem ser recompensados financeiramente pelo atingimento de determinada meta. 

Outra vantagem do earn-out é o estabelecimento de um critério caso existam divergências entre o cálculo do valuation da operação, por parte do comprador e do vendedor. Havendo a presença de uma cláusula de earn-out bem elaborada, há possibilidade de um consenso entre as partes, haja vista que serão pagos valores adicionais após o fechamento da operação – se a empresa cumprir determinadas metas. 

Por fim, o earn-out também proporciona uma garantia de que comprador e vendedor irão trabalhar em conjunto para garantir o atendimento de metas, haja vista que a cooperação de ambos será essencial para o atingimento da métrica, que dependerá substancialmente da forma como a administração da empresa é conduzida. 

 

Como calcular o valor a ser pago através da métrica de earn-out?

É possível definir, através do SPA, um valor fixo a ser pago no caso de atingimento de uma ou mais metas da empresa que fora objeto de venda. Contudo, existem várias outras maneiras de se estipular o valor a ser pago, que pode levar em consideração critérios como receita líquida ou EBITDA da empresa. 

Ainda, existem outras métricas utilizadas especialmente pelo mercado de empresas de tecnologia para a definição destes valores flexíveis, os chamados MRR (Monthly Recurring Revenue) e ARR (Annual Recurring Revenue). 

O cálculo do MRR se dá pela soma simples de todos os valores obtidos com os contratos de recorrência mensal de clientes da empresa, enquanto o ARR é um indicador que corresponde ao faturamento recorrente anual desta empresa. A métrica mais adequada para ser utilizada, entretanto, depende muito do modelo de negócios e de qual forma a sociedade se encontra posicionada no mercado. 

Em resumo, são importantes critérios a serem considerados quando da negociação de earn-out:

  • Definição da parcela variável do preço a título de earn-out através de fórmula com variáveis objetivas e que possa ser metrificados;
  • Definição de resultados objetivos a serem atingidos pela Sociedade Alvo, as quais irão disparar o gatilho de earn-out;
  • Definição clara de prazos de vigência do earn-out;
  • Delimitação da forma de pagamento; e
  • Previsão de hipóteses em que poderá haver retenção do pagamento do earn-out.

Se por um lado a cláusula de earn-out pode servir como uma boa solução entre as partes no embate de qual preço pegar pela Sociedade Alvo, por outro lado pode ser fonte geradora de conflitos, caso os elementos que a compõem não sejam analisados e negociados com profundidade por advogados especializados e familiarizados com operações de M&A.

Neste sentido, além de a cláusula de earn-out conter elementos com o maior nível possível de objetividade sobre quais são as metas que podem gerar ganhos adicionais aos vendedores, a previsão de métricas de resolução de eventuais conflitos é igualmente importante e precisa estar prevista no SPA. 

A cláusula de earn-out é um dos pontos que têm potencial para levar operações de M&A para a resolução de disputas (seja via judicial seja via arbitral, conforme previsão da cláusula de resolução de conflitos a ser acrescentada no SPA). Sua complexidade não está apenas em redigi-la, mas principalmente em avaliar, negociar e alinhar todas as variáveis que a compõem.

Por estas razões, é muito importante que a empresa busque advogados especializados em operações de M&A ao coordenar e participar ao lado da empresa neste tipo de operação de alta complexidade. Quando bem estruturada e negociada, a cláusula de earn-out poderá servir como um importante instrumento de consenso entre Comprador e Vendedor, tornando a operação de M&A mais fluida e aumentando suas chances globais de êxito.

Dúvidas? A equipe do Silva Lopes Advogados pode te ajudar!

 

*Lopes é CEO do Silva Lopes Advogados, Euzébio é sócio e Benz é integrante do time do escritório.