Ltda para S.A.: qual o momento correto para a transformação?

Confira o cenário geral das opções de tipos societários disponíveis ao empreendedor no Brasil

Ltda para S.A.: qual o momento correto para a transformação? Ltda para S.A.: qual o momento correto para a transformação?

Por João Paulo Fontoura, Gustavo Chaves Barcellos e Layon Lopes*

Para que a exploração de um novo empreendimento seja realizada de modo a mitigar a exposição sobre o patrimônio pessoal do empreendedor, é importante que, desde o início, a atividade empresarial seja explorada por meio de um veículo que responderá per si pelas obrigações do empreendimento, e não seus sócios.

Em outras palavras, o que se recomenda, desde o início de um novo negócio, é a constituição de uma empresa a explorar o novo negócio sob um tipo societário que seja capaz de oferecer a separação entre o conjunto de bens e obrigações da empresa e o conjunto de bens e obrigações da pessoa de seu sócio. Essa, em linhas gerais, é a separação entre a pessoa jurídica (empresa) e a pessoa física (sócio), com a consequente limitação da responsabilidade pessoal do sócio sobre eventual não sucesso do novo empreendimento.

No Brasil, ao constituir uma empresa, para que haja o benefício da limitação da responsabilidade pessoal do sócio, o empreendedor pode escolher um dos tipos societários previstos em lei, podendo a empresa alterar seu tipo societário ao longo de sua jornada a fim de adaptá-la conforme as diferentes fases as quais um negócio pode enfrentar.

Dentre os tipos societários mais utilizados no Brasil, e, portanto, os mais relevantes sob o ponto de vista do mercado, são: a sociedade limitada (LTDA), que pode ser constituída por um único sócio (unipessoal) ou por uma pluralidade de sócios e a sociedade anônima (S.A.), que via de regra deve ter mais de um sócio ou, ainda, admite a possibilidade de um único sócio, desde que seja outra pessoa jurídica (neste caso, a S.A. será uma subsidiária integral).

Ainda sobre aspectos gerais da S.A., este tipo de empresa pode ter suas participações societárias (isto é, suas ações) negociadas em bolsa de valores (no Brasil, a B3), podendo suas ações e títulos serem comprados ou vendidos por investidores atuantes na bolsa. Neste caso, a S.A. será de capital aberto, estando por esta razão também sujeita à regulação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), autarquia federal diretamente ligada ao Ministério da Economia.

Principais características e vantagens de cada um destes tipos societários

O caminho percorrido por muitas empresas é sua constituição como LTDA e, com a progressão do negócio e eventuais investimentos externos, sua transformação em SA.A grande questão é saber identificar qual é o momento correto de a empresa realizar esta movimentação sobre seu tipo societário, uma vez que tanto a LTDA e a S.A. trazem vantagens para diferentes cenários.

Sociedade de tipo LTDA

A LTDA é o tipo societário mais indicado na fase inicial no negócio, uma vez que a rotina societária é mais simples e com um custo operacional mais baixo, podendo ser conduzido pelo departamento jurídico interno da empresa aliado à assessoria jurídica externa especializada.

Além disto, a sociedade LTDA precisa registrar, manter e atualizar escrituração (Livro Balancetes Diários e Balanços, por exemplo) mais simples do que os Livros Sociais praticados pelas companhias de tipo S.A. (isto é, Livro de Registro de Ações Nominativas, Livro de Transferência de Ações Nominativas, Livro de Atas das Assembleias Gerais, Livro de Presença dos Acionistas e Livro de Atas e Pareceres do Conselho Fiscal).

A Administração da sociedade de tipo LTDA pode ser eleita diretamente pelos sócios via alteração do contrato social ou em ato separado. Isto é, a eleição e destituição dos membros da administração deste tipo societário é realizada de forma bastante próxima dos sócios, não havendo a figura do Conselho de Administração.

Outra vantagem da sociedade e tipo LTDA bastante explorada pelos empreendedores é a previsão legal de os lucros do empreendimento poderem ser distribuídos entre seus sócios de maneira desproporcional às participações societárias de cada sócio na sociedade. Lembrando que a distribuição desproporcional de lucros não é tema pacífico quando se fala em sociedade de tipo SA. Por exemplo, em uma sociedade LTDA composta por dois sócios, cada um titular de 50% do total de quotas emitidas pela sociedade, estes sócios poderão, em Reunião de Sócios, deliberar por distribuir os lucros auferidos pela sociedade de maneira diversa a 50% para cada sócio.

Assim, o menor grau de complexidade de sua estrutura, maior simplicidade de sua operação regular, uma estrutura de administração mais enxuta e próxima aos sócios e a possibilidade de distribuição dos lucros de forma desproporcional à participação societária de cada sócio na sociedade  tornam o tipo societário LTDA bastante atrativa ao empreendedor quando a empresa ainda está em sua fase inicial até o momento anterior à captação de investimento externo ou ingresso de sócios ou administradores diferentes dos fundadores da empresa.

Sociedade de tipo S.A.

A S.A. é indicada na fase mais avançada do negócio. O tipo societário oferece soluções ausentes na LTDA que, apesar de demandarem um cuidado e um custo maior na gestão dos atos societários da companhia, incluindo publicações legais, oferecem maior segurança aos acionistas, investidores e membros da administração.

Sob o aspecto da administração, além da Diretoria, os acionistas da companhia podem criar um Conselho de Administração, cuja função é fiscalizar a atuação dos Diretores, bem como manter, na tomada de decisões, o direcionamento estratégico dos negócios, de acordo com os principais interesses da companhia, protegendo seu patrimônio e maximizando o retorno aos acionistas sobre seus investimentos.

Percebe-se que na S.A. a atuação do acionista sobre a companhia não necessariamente ocorre de forma tão próxima como na sociedade de tipo LTDA, sendo, portanto, uma vantagem ao acionista, que poderá dedicar seu tempo e esforços a outros empreendimentos, concentrando-se em decisões de caráter mais estratégico ao negócio como um todo ao invés de sua rotina operacional.

Outra vantagem da companhia do tipo S.A. em comparação à sociedade de tipo LTDA, acompanhada também de um maior custo de gestão societária, é o registro das participações societárias emitidas pela companhia (isto é, as ações), bem como suas transações, serem realizadas em Livro Sociais, podendo o emissor controlar seu preço de emissão. Esta permissão legal das SA traz maior celeridade na emissão de novas ações e nas transações de ações, uma vez que seu registro dá-se nos Livros Sociais da companhia e não via alteração de contrato/estatuto social perante a Junta Comercial, tal qual ocorre nas sociedades de tipo LTDA. Além disso, o controle no preço de emissão de novas ações é ferramenta fundamental dentro do mercado de captação de investimentos pela companhia, pois permite que novos investidores aportem volume maior de recursos na companhia sem gerar a diluição na participação societária dos acionistas fundadores.

Por exemplo, uma empresa cujo capital social é de R$ 10 mil, através do mecanismo de controle de preço de emissão de novas ações, pode captar um investimento de R$ 10 milhões em troca de apenas 10% do total de ações emitidas pela companhia após o aporte do investimento. Isto se revela uma grande vantagem do negócio tipo S.A., pois caso a mesma operação ocorresse em uma sociedade de tipo LTDA, os sócios fundadores teriam sua participação societária diluída em mil vezes com a entrada deste investidor, assumindo os mesmos valores para o capital social e valor aportado citados no exemplo.

Por outro lado, considerando a obrigação legal de distribuição de dividendos obrigatórios, as companhias tipo S.A. devem distribuir seus lucros de forma proporcional à participação societária dos acionistas na empresa. Havendo, ainda, a possibilidade de algum acionistas receberem lucros com preferência aos demais em decorrência da possibilidade do negócio emitir ações de diferentes naturezas (ações ordinárias, com direito a voto e sem preferência no recebimento de lucros, ou ações preferenciais, sem direito a voto e com preferência no recebimento de lucros).

Afinal, qual é o momento correto para a transformação de uma empresa LTDA para S.A. ?

Como exposto acima, tanto a sociedade de tipo LTDA quanto a S.A. oferecem vantagens e desvantagens conforme o estágio de maturidade do negócio e da fase da jornada vivida pelo empreendedor. Ainda assim, mesmo havendo as particularidades de cada caso concreto, que são importantes de serem mapeadas por uma assessoria jurídica externa e especializada, via de regra a transformação da sociedade de seu tipo societário LTDA para S.A .se revela oportuno, sendo o momento correto para realizá-la, quando há o conjunto dos seguintes elementos:

  1. Departamento jurídico bem estruturado e preparado para lidar com uma rotina societária de uma S.A.;
  2. Acompanhamento da rotina societária da empresa por uma assessoria jurídica externa e especializada;
  3. Previsão de maior movimentação no quadro de sócios, principalmente de sócios para além do círculo de amigos e familiares dos fundadores;
  4. Necessidade de maior Compliance Corporativo de sua empresa;
  5. Realização de operações da empresa que envolvam participações societárias (tais como IPO, investimentos via aporte ao capital social, mútuo conversível, opção de compra de participação societária, Plano de Stock Option, Phantom Stock, Programa de Partnership ou até mesmo uma operação de M&A, por exemplo).

Neste contexto, independentemente do motivo que leve sua empresa à transformação em S.A., o trabalho coordenado entre o departamento jurídico interno da empresa e a assessoria jurídica externa especializada é fundamental para a adequada e segura realização deste tipo de operação tão importante para a empresa.

Dúvidas? A equipe do Silva Lopes Advogados pode te ajudar!

* Lopes é CEO do Silva Lopes Advogados, Fontoura é integrante do time e Chaves Barcellos é sócio do escritório.